terça-feira, 22 de setembro de 2009

A simbiose entre Brasil e Manuel Zelaya

Não é por acaso que a crise em Honduras voltou a tomar conta das manchetes nesta terça-feira. Tampouco foi ocasional o abrigo de Manuel Zelaya pela embaixada brasileira em Tegucigalpa. A retomada do assunto neste momento serve a ambos os lados – o do presidente deposto e o das ambições internacionais brasileiras.

Antes de entrar no mérito da questão, entretanto, acho válido lembrar que é natural que os países tenham planos e pretensões para a área de política externa. Portanto, nada de errado quando o Brasil reafirma suas intenções. Pelo contrário.

No caso da crise em Honduras, é útil a Zelaya e a Brasília que a comunidade internacional se volte para o assunto justamente quando representantes dos 192 estados-membros das Nações Unidas estão reunidos em Nova Iorque na véspera do pontapé inicial de uma das sessões da Assembleia-Geral mais aguardadas em muito tempo.

Ao receber Manuel Zelaya em sua embaixada na capital hondurenha, o Brasil se aproveita do momento para reafirmar aos olhos do mundo sua posição: é favorável ao Estado de direito e à democracia.

O expediente consegue elevar o capital da política externa brasileira e está sendo usado como forma de apresentar em igualdade de condições as questões que são caras ao governo Lula ao lado de tantas outras (programa nuclear iraniano, retomada do diálogo entre Israel e os palestinos, escudo antimísseis americano etc) que estarão em discussão em Nova Iorque nos próximos dias.

Trata-se de um golpe de mestre. Para Zelaya é igualmente útil, obviamente, uma vez que ele voltará ao foco depois de meses de esquecimento e notinhas de pé de página nos jornais.

Para mim fica claro, no entanto, que os ganhos servem mais ao Brasil, já que, mais uma vez, o assunto mostra o potencial de liderança regional exercida pelo país e lembra aos membros da ONU a principal reivindicação de Brasília: a reforma do Conselho de Segurança e a inclusão permanente do país.

O troféu cara de pau da vez vai para o presidente interino Roberto Micheletti, que, em artigo publicado na edição de hoje do Washington Post, tentou amenizar a característica não democrática intrínseca a seu governo.

“Diante de todas as reclamações (internacionais) que ocorrerão nos próximos dias, o ex-presidente (Zelaya) não irá mencionar que o povo de Honduras seguiu em frente desde os eventos daquele dia (o golpe de final de junho) e que nossos cidadãos estão à espera de eleições livres, justas e transparentes que ocorrerão em 29 de novembro”.

Quer dizer que o mundo todo deve esquecer que o presidente eleito do país foi retirado à força e nenhum país deve se manifestar diante deste fato? O povo hondurenho que “seguiu em frente” é o mesmo que tem sido punido diariamente com toques de recolher e violência policial? É melhor nem comentar.

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