terça-feira, 23 de novembro de 2010

Coreia do Norte manifesta ambiguidade. Mais uma vez

O ataque de hoje promovido pela Coreia do Norte à ilha de Yeonpyeong, no lado sul da disputada fronteira marítima entre as duas Coreias, pode ser interpretado de muitas maneiras. Não há dúvidas de que a escalada de violência na região deixa o mundo todo em alerta. Mas a globalização aponta algumas semelhanças entre países suspeitos de prosseguir com programas nucleares cujos fins seriam militares: quanto mais inconsequente – ou quanto mais parecer inconsequente –, melhor.

Esta é uma forma de manter em permanente estado de alerta aqueles que tentam negociar com potências atômicas. A característica humana da insanidade é propositalmente transportada para governos – por mais estranho que isso possa parecer. Desta maneira, o Irã tem conseguido, bem ou mal, se equilibrar. Desta maneira também está agindo a Coreia do Norte.

Desde o estabelecimento das negociações de seis partes (como são chamadas as seguidas rodadas de conversas entre Pyongyang e potências internacionais), em agosto de 2003, o regime de Kim Jong-il deu muitos passos adiante e outros tantos em sentido contrário.

E assim, sempre aceitando enormes quantias de dinheiro quando promete interromper seu programa nuclear, a situação segue exatamente no mesmo ponto. Aliás, há duas semanas o Ocidente teve uma bela resposta: a Coreia do Norte convidou Siegfried Hecker, ex-diretor dos laboratórios Los Alamos, nos EUA, para conhecer as instalações nucleares do país. Foram três horas e meia de visita às centrífugas de enriquecimento de urânio. No auge do senso de humor, o governo jura que pretende apenas produzir eletricidade.

O ataque de hoje é permeado de explicações muito plausíveis por sinal: seria uma reação norte-coreana aos exercícios militares conduzidos pela Coreia do Sul realizados próximos à chamada Linha de Limite ao Norte, fronteira marítima entre os dois países reconhecida pela ONU, mas que não conta com a aprovação da Coreia do Norte; ou marca o início do processo de sucessão de Kim Jong-il – segundo o pesquisador sul-coreano ouvido pela revista Time Cheong Seong-Chang, Kim Jong Un, o filho do ditador, estaria sob influência de um grupo de generais ainda mais linha-dura.

Acredito mesmo que tais motivos tenham contribuído para os ataques de hoje. Mas acho também que a demonstração de força segue a linha de reforçar ainda mais o perfil inconsequente construído pelo regime mais fechado do planeta. As interpretações sobre os acontecimentos são sempre lógicas demais, muito embora a Coreia do Norte dê repetidas mostras de ambiguidade internacional. Por exemplo, o bombardeio acontece no dia seguinte ao envio de delegados do país à Coreia do Sul para discutir, com o auxílio da Cruz Vermelha, o envio de ajuda a Pyongyang.

A explicação menos politicamente correta e mais compatível com o contexto vem de Praveen Swami, editor de Diplomacia do britânico Daily Telegraph.

"Ao atacar uma ilha sem qualquer valor estratégico, o regime disfuncional – mas eminentemente racional – da Coreia do Norte pretende mostrar ao mundo quanta dor pode causar se não for subornado para se comportar. Ambos os lados querem riqueza, não guerra – e o armamento nuclear é o meio norte-coreano de obter isso", escreve.

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