quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Crise na Irlanda: todo mundo é culpado, mas caberá somente ao povo o ônus da austeridade

A confusão econômica europeia atinge em cheio a Irlanda. A discussão sobre se vale ou não a pena aceitar o pacote monetário de resgate oferecido pela União Europeia gira em torno também das variáveis políticas. Os irlandeses se sentem especialmente incomodados com a possibilidade de a Grã-Bretanha ser uma das principais agentes de salvação. É interessante que o debate de ideias tenha seguido por este caminho.

Ao que parece, Dublin deve ceder às fortes pressões. Segundo o dirigente do Banco Central Irlandês, Patrcik Honohan, o país vai receber um empréstimo bastante substancial, muito embora o governo da Irlanda negue mesmo ter pedido a ajuda.

No centro deste imbróglio está o Fianna Fáil, partido no comando do país desde a criação do Estado nacional irlandês. Não seria espantoso se a crise econômica levasse junto o movimento. Ou ao menos revigorasse a oposição, o que seria bastante natural. O que tem dificultado, inclusive, a possibilidade de a Irlanda aceitar o pacote de resgate é justamente a posição adotada pelo Fianna Fáil de que a soberania do país está em jogo.

Este discurso não é completamente inválido, na medida em que todo mundo conhece as pesadas contrapartidas exigidas pelo FMI - um dos protagonistas da injeção monetária - em troca da suposta "salvação" econômica. Talvez o partido político irlandês não esteja comunicando corretamente sua posição. Ou esta seja uma estratégia proposital de forma a evitar alarmismos. De qualquer maneira, a diretriz oficial está longe de ser unanimidade.

"Em certo ponto, a intervenção de UE e FMI não é necessariamente ruim. Signfica que as decisões de como podemos viver de acordo com as nossas condições serão forçadas goela abaixo dos interesses competitivos que bloquearam qualquer resposta nacional genuína à crise", defende editorial do Irish Times.

Enquanto as conversas teóricas mantêm passo firme, a situação econômica do país é cada vez mais catastrófica. O déficit já alcançou a incrível marca de 32% do PIB. Se parece não haver mais tempo para decidir, é preciso que o governo seja muito cuidadoso com o caminho que irá escolher. Acho que isso explica a aparente inércia de Dublin diante do caos iminente. Se for isso, seus dirigentes apresentam comportamento ético único em todo mundo. Não se poder atribuir o ônus à população.

Esta guerra verbal capitaneada pela Alemanha se enquadra bem neste dilema. Como escrevi ontem, Berlim tem usado seu status econômico como prerrogativa para desancar os demais países. Isso é contraditório hoje, na medida em que, de certa maneira, se não fosse a "irresponsabilidade consumista" dos tempos de vacas gordas em boa parte do Estados europeus hoje na penúria, as empresas alemãs - e por consequência o país inteiro - não estariam entre as mais "saudáveis" e lucrativas do continente. Por isso tendo a concordar com a posição de Alan Posener, comentarista da Die Welt e um dos mais influentes blogueiros alemães.

"São os gregos e irlandeses que não podem encontrar uma saída (...) e estão encarando anos de austeridade para compensar as extravagâncias do passado. Um passado em que você não escutava Mercedes, Siemens e companhia reclamarem que essas pessoas compravam um monte de coisas com as quais não poderiam arcar; um passado em que bancos, que supostamente deveriam monitorar o mercado e avisar sobre eventuais crises, permaneceram estranhamente silenciosos", escreve.

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