quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Por que Lula está satisfeito com vazamentos promovidos pelo WikiLeaks

Há cerca de uma semana, o presidente Lula defendeu publicamente o WikiLeaks. Para ele, a questão é muito simples: o meio de divulgação não pode ser culpado pelo conteúdo das informações tornadas públicas. Este é um raciocínio coerente. No final das contas, o governo brasileiro perdeu muito pouco com o vazamento, pelo contrário. As impressões dos representantes americanos sobre as diretrizes políticas brasileiras de certa forma fizeram muito bem à linha determinada não apenas pelo Palácio do Planalto, mas também pelo Itamaraty.
Correspondências enviadas por oficiais americanos mostram preocupação dos EUA com a relação próxima entre Brasil e Irã. Esta não é uma novidade e, de fato, Brasília não esconde o desejo de se tornar mais presente nos palcos de negociações internacionais. A proximidade com os iranianos é encarada pelo Itamaraty como o trampolim viável para levar a cabo este projeto.
Em outro trecho vazado, um vice-secretário americano diz que Hugo Chávez é louco e "nem mesmo o Brasil estaria disposto a apoiá-lo". Esta é uma revelação neutra, que beira a positividade. Se uma das críticas de parte da sociedade brasileira e dos EUA é justamente o relacionamento entre Lula e o presidente venezuelano, quando autoridades dos EUA já questionam tal apoio o Brasil não tem mais nada a provar, certo?
Outro ponto interessante trata da recusa brasileira, em 2005, de acolher prisioneiros de Guantánamo. Neste aspecto, o país não foi o único a não cooperar. Na verdade, a maior parte dos países fez o mesmo. E, se a política externa do Itamaraty se pretende independente, o governo brasileiro adotou postura coerente neste caso.

A única contradição - mas que mesmo assim não é negativa sob o ponto de vista das relações internacionais ocidentais - é a cooperação velada de Brasil e EUA na busca empreendida a suspeitos de planejar ou apoiar o terrorismo na América do Sul. Obviamente, Brasília nega tal aliança com por conta das diretrizes externas do governo. E também por isso o país não possui legislação específica destinada a coibir o terrorismo.
Revelação recente dá conta de que o general Jorge Armando Félix afirmou ao ex-embaixador dos EUA que o Brasil deveria estar preparado a pagar um preço alto se quisesse se envolver em ações militares internacionais. O preço alto no caso seria a morte de soldados do país durante tais operações. Por mais doloroso e sincero que seja este depoimento, as palavras de Félix simplesmente representam o prolongamento prático da doutrina em vigor no Itamaraty - para qual o Brasil precisa se expor mais internacionalmente em nome do reconhecimento futuro.
Para completar, o partido do presidente Lula ainda recebeu um presentão: o vazamento de documentos que dão conta de que José Serra teria prometido a empresas petrolíferas americanas se empenhar a alterar as regras de exploração do pré-sal, se eleito presidente.

As companhias dos EUA estão descontentes com mudanças impostas pelo governo brasileiro na legislação que aprofundam o papel do Estado sobre o setor. Serra já divulgou nota negando tal informação. Mas acredito que o estrago já está feito. E ele não atinge apenas o ex-candidato, mas o próprio PSDB. Afinal, o partido fica em situação muito delicada, uma vez que um de seus principais nomes teria prestado fidelidade a empresas privadas americanas em detrimento dos interesses brasileiros. É uma denúncia grave que precisa ser muito bem esclarecida.
Diante de todo este cenário, realmente não há como Lula estar chateado pelos vazamentos.

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