terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Sobre revoluções, Egito e Irã

Como bem lembra David A. Bell em artigo publicado na Foreign Policy, é um tanto equivocado usar o termo revolução para definir os protestos no Egito. Assim como aconteceu na Tunísia, o objetivo dos manifestantes do Cairo é bem pragmático: derrubar o presidente do país. E acontecimentos deste tipo já se repetiram muitas vezes na história mundial. Inclusive aqui no Brasil. Aliás, ao que me lembro, ninguém costuma chamar o senador Lindberg Farias de líder dos revolucionários do início dos anos 1990.

Longe de qualquer avaliação momentânea, a revolução em curso durante mais de 30 anos no Oriente Médio é a iraniana. Sei que soa estranho dizer isso – até porque a palavra adquiriu significado positivo –, mas a revolução islâmica de fato introduziu elementos novos e rompeu com o paradigma anterior. E por isso as autoridades do Irã também decidiram se manifestar. Porque querem expandir seu modelo de administração. Afinal, contar com um aliado importante como o Egito seria um passo muito grande rumo à liderança hegemônica regional – o mais importante objetivo geopolítico de Teerã.

O problema para o governo iraniano é que ele não detém o monopólio sobre a ideologização dos acontecimentos no Egito. Os EUA querem reverter a situação a seu favor, transformar essa história em vitória da democracia; as demais populações do Oriente Médio igualmente insatisfeitas com as respectivas administrações autoritárias buscam inspiração no Egito; e até a oposição iraniana quer aproveitar os eventos para requisitar mudanças mais profundas no país. Aliás, os candidatos derrotados por Ahmadinejad nas contestadas eleições de 2009 não conseguiram autorização governamental para organizar uma passeata em solidariedade aos egípcios.

 
No fundo, há muitas diferenças entre Egito e Irã. A primeira delas diz respeito às forças armadas. Se o governo de Teerã mantém

aparatos militares profundamente vinculados à patrulha ideológica inerente à sustentação do regime, o exército egípcio é secular, pragmático. Isso não quer dizer, de nenhuma maneira, que este cenário é permanente. Tenho escrito por aqui que há um grande apoio dos manifestantes do Egito à participação do islamismo na vida política do país. Se isso se concretizar – e nada demonstra que a Irmandade Muçulmana não exercerá papel importante no novo governo –, não é impossível imaginar uma espécie de ideologização militar.

 
Aliás, esta é a maior preocupação de EUA e Israel. Não tenho dúvidas de que o regime iraniano vai tentar algum tipo de aproximação com o novo governo do Egito. Ainda mais por conta deste vácuo de poder que se instalou no país. Quando a situação estiver mais resolvida, Teerã vai fazer questão de recordar a associação entre Mubarak e Washington. E a revolução islâmica é sempre um excelente produto de exportação.

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