terça-feira, 19 de junho de 2012

No Egito, os militares tomam o poder por tempo indeterminado


O candidato da Irmandade Muçulmana à presidência do Egito ganhou as eleições. Ganhou mas não levou, vale dizer. Como já se imaginava, o Scaf (sigla em inglês para Conselho Supremo das Forças Armadas) mostrou suas reais intenções e decidiu agir abertamente como uma junta militar, como numa ditadura. Dissolveu o parlamento – onde a Irmandade Muçulmana conseguiu ampla maioria – e esvaziou a própria presidência do país, deixando o futuro líder eleito sem poderes para comandar as forças armadas e o orçamento. 

O projeto de democracia no Egito esbarrou nos militares. Da mesma maneira como o extenso mandato do ex-presidente Hosni Mubarak dependia plenamente do apoio do exército. Como a situação na Síria tem mostrado, como escrevi tantas vezes ao longo do último ano e meio, não há revolução sem tomada do poder coercitivo ou adesão de parte importante dos responsáveis por este mesmo poder coercitivo. No final das contas, não se faz revolução com slogans, como muita gente imaginava. 

O exército é a principal força no país e só os ingênuos poderiam imaginar que seria fácil colocá-lo de lado. Agentes econômicos importantes, os militares estão presentes em todos os setores produtivos; desde a fabricação de tanques e armas a empresas de liquidificadores. Pode soar estranho, mas o tecido socioeconômico egípcio funciona desta maneira. A Irmandade Muçulmana que conquistou votos e amplo apoio popular legalmente é exatamente o mesmo grupo que, durante o período Mubarak, permaneceu na ilegalidade. 

O curioso agora é perceber como o Ocidente irá se posicionar. As circunstâncias bizarras levaram a Irmandade Muçulmana a representar a democracia. EUA e União Europeia optarão por sustentar a posição de defesa da democracia mundial, mesmo que isso signifique defender os interesses de um grupo tão contraditório como a Irmandade Muçulmana? Ou se absterão de grande participação neste processo, percebendo o potencial explosivo deste assunto? 

Eu diria que europeus e americanos deverão escolher o caminho da discrição, ignorando com “classe” o que se passa no Egito. Quando uso este termo quero dizer que eles se pronunciarão, mas com menos firmeza e prontidão do que quando se interessam de verdade. Ou seja, vamos ver as generalidades diplomáticas, chavões do tipo “apoiamos um governo democrático no Egito que possa atender aos anseios da população e contribuir na estabilidade regional”. Enquanto isso, o maior país árabe e ponto importante da geopolítica do Oriente Médio continua sem governo e perspectiva de futuro. O vácuo institucional já dura um ano e quatro meses.

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