terça-feira, 27 de janeiro de 2015

A liberação de Auschwitz, o ressurgimento do antissemitismo e a responsabilidade europeia

Setenta anos depois da liberação de Auschwitz-Birkenau pelo exército soviético, o debate europeu sobre antissemitismo está mais vivo do que nunca. Setenta anos depois, a perseguição aos judeus está longe de ser institucional, mas ainda acontece na Europa. Aliás, a Europa ainda debate sobre as possibilidades de suas minorias, os judeus, inclusive. A questão judaica – que durante séculos foi o centro do debate sobre a relação europeia com o outro – parecia solucionada. As comunidades judaicas no continente estão plenamente integradas. Mas o renascimento do antissemitismo reacendeu a discussão sobre o futuro dos judeus na Europa e também sobre a capacidade do continente de dialogar com as diferenças. 

A cada ano, mais sobreviventes do Holocausto morrem. Na comemoração dos 60 anos da liberação de Auschwitz,  1,500 sobreviventes estavam presentes. Agora, dez anos depois, cerca de 300 estiveram na cerimônia. A tendência é que, em pouco tempo, não haja mais sobreviventes vivos. Daí a importância de organizações que cuidam da memória do Holocausto. Projetos pessoais, como o Survivors Of The Shoah Visual History Foundation (Fundação da História Visual dos Sobreviventes do Holocausto), criado pelo cineasta Steven Spielberg, vão dar conta de manter para sempre os relatos pessoais de quem passou pelos campos de concentração. No entanto, a cada década de distância, o antissemitismo parece se tornar menos tabu, conquistando adeptos das mais diversas correntes políticas e classes sociais. 

“Logo depois da Segunda Guerra Mundial, depois que vimos a realidade de Auschwitz e outros campos de extermínio, nenhuma pessoa normal queria estar associada ao antissemitismo. Mas, à medida que  o Holocausto se distancia no tempo e os sobreviventes desaparecem, extremistas se tornam mais ousados em atacar os judeus. Alimentados pela falsa narrativa que culpa Israel por uma grande lista dos problemas mundiais, o antissemitismo ressurge de forma mortal”, diz Ronald Lauder, presidente do Congresso Judaico Mundial, organização que representa comunidades e instituições judaicas em cem países. 

Como sempre escrevo por aqui, o Holocausto não foi um fenômeno isolado no tempo, mas a concretização mais dramática de séculos de antissemitismo europeu. O Holocausto foi realizado por gente comum, por europeus ditos “civilizados”. O Holocausto ocorreu na Europa pós-iluminista. Setenta anos depois, e ano após ano, a comemoração pela liberação de Auschwitz ainda reforça a necessidade europeia de debater o antissemitismo, as questões de identidade do continente e a responsabilidade sobre suas minorias.